Publicado em 16/05/2024 às 15h07 Brasil Saúde
Veneno de aranha-armadeira apresentou bons resultados no tratamento do câncer de mama
Foto: Catarina Rapôso/Arquivo pessoal e Luciano Lima/TG
A busca por novos procedimentos que potencializem os efeitos positivos dos tratamentos convencionais contra o câncer e que deem mais qualidade de vida a pacientes mobiliza pesquisadores de diversas áreas. Na Unicamp, um estudo conduzido na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) investiga os benefícios que alguns componentes encontrados no veneno de uma espécie de aranha-armadeira (Phoneutria nigriventer) podem proporcionar no combate ao câncer de mama.
Os resultados obtidos até o momento indicam que o uso desses compostos combinado com o de quimioterápicos e retardou a progressão de tumores, aumentando o bem-estar de camundongos fêmea. A análise faz parte da pesquisa de doutorado de Ingrid Trevisan e os testes foram conduzidos no Laboratório de Terapias Avançadas (Latera), coordenado pela professora Catarina Rapôso, orientadora da Trevisan.
Dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) apontam que, no período entre 2023 e 2025, prevê-se o diagnóstico de 73.610 novos casos de câncer de mama no Brasil, sendo esse o câncer de maior incidência em mulheres depois do câncer de pele. Por se tratar de uma enfermidade decorrente do crescimento desordenado de células mamárias, a doença é muito comum entre animais mamíferos, respondendo, por exemplo, por 45% a 50% das neoplasias identificadas em cadelas, de acordo com o Conselho Federal de Medicina Veterinária.
Por que a aranha-armadeira?
O veneno do aracnídeo chamou a atenção de cientistas por conta dos efeitos no sistema nervoso das presas, podendo levar a convulsões, por exemplo.
Com isso, a professora Catarina Rapôso, que estuda a substância há 20 anos, passou a analisar a ação do composto em tumores formados no sistema nervoso central, também chamados de gliomas.
Os efeitos positivos nos gliomas levaram, mais tarde, à pesquisa de doutorado da médica veterinária Ingrid Trevisan, orientada por Rapôso. Nela, as cientistas avaliaram a forma como o veneno isolado agiu em tumores de mama diagnosticados em cadelas.
Como foram os experimentos?
Após respostas positivas de testes in vitro com células animais de mastocitoma, linfoma cutâneo, carcinomas de bexiga e carcinomas de mama, as pesquisadoras passaram a testar o composto isolado em camundongos fêmeas.
As roedoras, que tinham tumores mamários induzidos em laboratório, receberam três tratamentos diferentes: um com a molécula isolada do veneno, outro com o composto combinado a um quimioterápico tradicional e, por fim, apenas o quimioterápico.
“Vimos que os tumores associados com a molécula e o quimioterápico reduziram significativamente, diferentemente dos que a gente fez o tratamento só com quimioterápico padrão. Além disso, observamos durante os ensaios que os camundongos tratados com veneno tiveram uma boa qualidade de vida, aumentaram o peso, a ingestão de alimentos, e não tiveram efeitos adversos”, destaca a médica veterinária e doutoranda na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), Ingrid Trevisan.
Novos tratamentos
Depois da produção de uma molécula sintetizada em laboratório, o próximo passo da pesquisa será testar os seus efeitos. Nessa nova fase, a sobrevida dos animais após o tratamento será analisada. A doutoranda explica que, dependendo dos resultados que obtiverem, os compostos serão testados em animais em clínicas veterinárias parceiras. A ideia consiste em tratar cadelas com câncer de mama, em uma etapa que pode abrir caminhos para futuros testes clínicos. “Se tivermos uma resposta positiva, teremos uma evidência do potencial da sua aplicação em seres humanos.”
O projeto de Rapôso e Trevisan vai ao encontro de uma tendência crescente da indústria farmacêutica: o interesse por fontes naturais para o desenvolvimento de fármacos. Nos últimos anos, o avanço tecnológico nesse campo contribuiu para colocar os produtos naturais como líderes na produção de medicamentos. No caso do câncer, isso significa uma possibilidade a mais de combater uma doença que ataca o organismo de várias maneiras. “A terapia combinada tem sido uma estratégia muito usada, muito pesquisada. E parece ser valiosa para o tratamento do câncer. Isso faz sentido porque essa é uma doença com vários mecanismos envolvidos. Não adianta atuarmos com apenas uma estratégia de combate”, defende Rapôso.
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