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Ex-bombeiro morre vítima de um AVC, mas continua salvando pessoas

Família de Sidinei Belchior, de 59 anos, fez 11 doações após a confirmação da falência cerebral; foi a 2ª captação de órgãos do Haoc este ano

 Publicado em  21/05/2022 às 09h19  Indaiatuba  Saúde


DENISE KATAHIRA

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O ex-bombeiro de Indaiatuba Sidinei Belchior, de 59 anos, continuou salvando pessoas mesmo após morrer vítima de um Acidente Vascular Cerebral hemorrágico (AVC) no domingo (15). Após a confirmação da morte encefálica, a família dele autorizou a doação do coração, fígado, rim, pâncreas, pulmão, córnea, músculo/tendão, pele, vasos, osso e intestino, que atenderão a fila de transplantes.

Esta foi a segunda captação de órgãos realizada pelo Hospital Augusto de Oliveira Camargo (Haoc) neste ano. Na semana passada outra paciente de 64 anos, com morte por AVC, também doou fígado, rins e córneas. 

“Ao doar os órgãos, meu irmão devolveu a esperança a 11 famílias que sofriam na espera de um transplante”, disse Suzy Domingues Belchior Pianucci.

Para suas filhas, Fernanda e Débora Belchior, Sidinei como pai sempre foi uma pessoa que fez o possível e impossível para o melhor, desde estudo até as coisas materiais. “A educação que recebemos dele reflete muito hoje em dia. Eu sempre reparava que ele desejava um bom dia e um bom trabalho em cada local que ele entrava e eu levo muito isso comigo”, conta Fernanda.

Solange, sua esposa, conta que Sidinei era uma pessoa transparente. “Homem muito sério em todas as coisas que fazia, tinha que ser perfeito e feito da forma correta. Marido dedicado à casa e à família. Foram 31 anos de casados, metade da minha vida”.

As filhas contam que a doação de órgãos sempre foi bem conversada dentro de casa e todos da família são doadores. “Terminamos a missão dele da forma mais generosa e linda! Assim do jeitinho que ele sempre quis, e foram os 11 órgãos aceitos para a doação, todos possíveis. Acredito que cada um que receber, que terá um pedacinho dele, será tão amado quanto ele”, disse Débora. “Que meu pai sirva de exemplo com essa atitude. Que todos pensem e pesquisem sobre a doação de órgão”, completa Fernanda.

Salvar vidas

“Nossa missão era deixar a pessoa mais calma. Na ocorrência a pessoa já está com trauma e levávamos segurança e a certeza de que tudo ia dar certo. Levávamos alegria”, conta o 2°sgt Pagnardi, que trabalhou com Sidinei por muitos anos, ao lado do auxiliar Valério.

Pagnardi conta que uma das ocorrências que marcaram a vida profissional dos três foi quando atenderam uma mulher em trabalho de parto. “Era madrugada quando recebemos o chamado lá no Morada do Sol. Foi um momento único e muito especial para nós”, lembra.

O também amigo de profissão, Luís Henrique, conta que foi através de Sidinei que ele se tornou uma pessoa mais observadora na parte de segurança, quanto à prevenção de incêndios e atendimento a primeiros socorros. “Já pude utilizar várias técnicas aprendidas com ele, além de realizar resgates a vítimas. Inclusive em uma ocasião, a mais importante, foi o resgate da minha filha convulsionando”.

“Eu sinto muito orgulho dele, que mesmo na sua partida seguiu o seu propósito de salvar vidas como sempre fez em sua carreira”, complementa Luís Henrique.

Bom amigo

Amigos há quase 40 anos, Vladimir Gaspar, conta que Sidinei era como um irmão mais velho. “Eu quero dizer o orgulho e o quanto admiro esse amigo que escolheu a profissão de salvar vidas e na morte salvou 11 pessoas”.

Amigos desde os 80, Roberto Carlos de Sousa, revela que foi o cupido. “A Solange era minha amiga e fui eu que os apresentei. A nossa amizade permaneceu por todos esses anos. Ele sempre foi um cara nota 10 e ajudava a todos”.

Eu sou seu fã

Para quem escreve como eu, ouvir uma frase como essa é uma das melhores sensações.

Mas para quem trabalhou com políticos como eu, às vezes uma frase como essa só tem aquele gostinho doce de chiclete, ou seja, é boa apenas no começo.

Logo a gente se decepciona, porque não era verdade.

Sidinei Domingues Belchior me disse a frase quando viu os meus primeiros trabalhos, isto lá em 1979.

Éramos amigos desde a antiga quarta série do então primário, hoje ensino fundamental.

Pela forma como nos conhecemos, não era nem para sermos amigos. Nosso professor, o seu Orlando, de feliz memória, criou um campeonato de notas entre os alunos.

Eu e Sidinei brigávamos pelo primeiro lugar todo dia.

Ele sempre foi muito inteligente, de raciocínio rápido, criativo. Eu, persistente, competitivo, incansável.

Não demorou para que saíssemos no braço.

Eu era briguento. Quando estudei no Sesi, em Salto, tinha uma briga por dia. Vangloriava-me de nunca apanhar.

A primeira vez que apanhei foi justamente do Sidinei.

A rua do Bela Vista, em Salto, era de terra e tinha muitos pedriscos para facilitar o tráfego. Ele só me deu um empurrão. Cai nas pedras, ralei os joelhos, braços, cortei a boca. Sangue para todo lado e a raiva também.

Mas o Sidinei sempre foi uma pessoa alegre, que gostava de fazer as outras pessoas alegres. Fizemos as pazes antes de uma vingança e nos tornamos amigos.

Tempos depois trabalhamos juntos no primeiro jornal onde exerci o jornalismo após me formar na faculdade, “O Trabalhador”, em Salto, que já não existe mais.

O Sidinei descobriu as minhas poesias nessa época. Eles as decorava e as declamava para as meninas nos ônibus da Nardelli, que usávamos para o trabalho no jornal.

Se a paquera dava resultado, ele contava que era minha.

Se não, ficava o dito pelo não dito.

Conhecemos muita gente por causa das poesias.

Ele sempre me dizia: sou seu fã.

Depois desse período, cada um seguiu o seu caminho.

Só em 2021, Sidinei me reencontrou pela rede social. Entrou em contato, pediu o whatsapp e passamos a trocar conversas. Novamente, ele demonstrou admiração pelo meu trabalho. Todo texto que eu publicava, ele gravava em vídeo e fazia uma interpretação própria, criando, com sua habilidade de bom comunicador, uma nova história.

Assim que ficava pronto, ele me mandava para ver o que eu tinha achado e regravava, se dissesse que não gostara.

- Precisamos marcar um café e nos reencontrarmos. Já faz muitos anos que não nos vemos, ele disse.

- Claro que sim, concordei.

Mas o reencontro nunca aconteceu e estava remarcado para uma data futura até eu ser informado que o meu grande amigo havia sofrido um AVC.

Fui colocado no grupo da família para acompanhar a sua recuperação e rezar junto com todos.

Infelizmente, o Sidinei Domingues Belchior partiu nesta semana sem que nada pudesse ser feito.

Não tive a oportunidade de reencontrá-lo e tampouco de falar da minha admiração por ele, mas hoje registro aqui:

- Sidinei, eu sou seu fã.

Eloy de Oliveira é escritor e editor-chefe do Mais Expressão.

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