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Pais devem dividir a cama com os bebês?

Conheça prós e contras da cama compartilhada

 Publicado em  30/06/2014 às 17h06  Brasil  Variedades


Com algumas mensagens de saúde pública todos concordam: “Nunca beber e dirigir”. “Sempre transporte o seu bebê em uma cadeirinha no carro”... Outras mensagens de saúde pública parecem nos pedir para fazer o impossível: “Adolescentes não devem ter relações sexuais”. “Mães não devem dividir a cama com seus bebês”...

Nos Estados Unidos, os pais são incentivados a nunca compartilhar a cama com os bebês. Este é o posicionamento oficial da Academia Americana de Pediatria. Por lá, anúncios assustadores para reforçar essa recomendação não faltam. Um deles mostra uma cama queen-size com uma lápide no lugar da cabeceira, onde se lê:  "Para muitos bebês, no ano passado, esta foi a sua última morada". Outro mostra um bebê em uma cama de adulto com um cutelo, afirmando que "Seu bebê dormir com você pode ser tão perigoso".

Por aqui, o assunto ainda é controverso, mesmo entre as instituições de referência: Sociedade Brasileira de Pediatria e Sociedade Pediatria de São Paulo. Apesar do co-leito não ser recomendação habitual, especialmente por conta de riscos, quando avaliamos alguns textos, encontramos citações como:

”... Se por um lado existe a recomendação de evitar o co-leito em qualquer idade (40-42), outros autores sugerem que não seria o co-leito per se, mas, sim, outras situações ambientais onde ocorre o co-leito que causariam um risco maior para a SMSL (44-46).”

Ou essa outra colocação do mesmo texto publicado no SBP Ciência, em uma “revisão crítica da literatura atual sobre a Síndrome da Morte Súbita do Lactente (SMSL) que discutem aspectos práticos sobre fatores de proteção e orientação sobre posição para dormir”.

“... É importante também considerar a opção dos pais pelo co-leito e recomendar situações que promovam um "ambiente de sono seguro" para a criança: colocar a criança para dormir em posição supina, com roupa de dormir adequada, num local da cama sem risco de queda e que especialmente a mãe não utilize álcool ou drogas que dificultem os cuidados e atenção à criança.”

Ou nessa matéria da SBP, em que os autores fazem a seguinte referência:

“... - Sono compartilhado: se a mãe for tabagista o risco de SMSL aumenta. Entretanto foi observado em países onde os bebês culturalmente compartilham o leito com a mãe que a incidência de SMSL é baixa.”

“O fato é que, tanto nos Estados Unidos, quanto no resto do mundo, em todos os estratos sociais e em todos os grupos étnicos, a maioria das mães dorme com seus bebês, pelo menos por algum tempo, apesar de todos os conselhos em contrário, e isto é particularmente verdadeiro para as mães lactantes”, afirma o pediatra e homeopata Moises Chencinski (CRM-SP 36.349).

Também sabemos que os pais que tentam evitar o compartilhamento da cama são muito mais propensos a alimentarem seus bebês, durante a noite, em cadeiras e sofás, numa tentativa de se manterem acordados, o que realmente aumenta o risco de sufocamento. De acordo com um estudo com quase 5.000 mães norte-americanas, em uma tentativa de evitar o compartilhamento de cama, 55% das mães alimentam seus bebês durante a noite em cadeiras, poltronas ou sofás. 44% por cento (25% da amostra) admite que adormece com seus bebês nesses locais, o que é preocupante.

O conselho de nunca dormir com o bebê saiu pela culatra. Ao invés de prevenção de mortes, este conselho pode, provavelmente, aumentar o número de mortes. Em outro estudo, pais de duas crianças que tiveram a Síndrome da Morte Súbita Infantil (SMSI) dividiam o sofá com os filhos e alegavam que tinham sido desaconselhados a levar seus filhos para a cama, mas não tinham sido informados sobre os perigos de dormir em um sofá.  Na verdade, as mortes por SMSI na cama dos pais caiu pela metade no Reino Unido, entre 1984-2004, mas tem havido um aumento de mortes devido ao fato de pais e bebês dormirem juntos em sofás.

Tanto nos EUA quanto aqui, o co-leito pode muitas vezes não ser discutido nos consultórios pediátricos. Os pediatras podem se sentir desconfortáveis em ​​mencionar o assunto, com medos das responsabilidades, e os pais podem ter medo de críticas, se perguntarem sobre o tema. “Então, ele é varrido para o subsolo. Como a maioria dos mamíferos, mães e bebês humanos são atraídos para dormir um ao lado do outro, e as crianças e as mães dormem em sincronia quando dormem juntos. Nenhuma publicidade ou proibição pode mudar o que é quase certamente um imperativo biológico profundamente enraizado. A falta de oportunidade de discutir o assunto com os pediatras desperdiça uma oportunidade para a educação e a discussão equilibrada”, defende o médico.

Em contrapartida, as autoridades médicas do Canadá, Grã-Bretanha e Austrália têm mensagens diferentes da Academia Americana de Pediatria. Estas entidades reconhecem que a maioria das mães divide a cama com seus bebês, pelo menos por algum tempo. Se as mães optam pelo co-leito, as entidades médicas devem educar o público sobre os problemas decorrentes desta opção e sobre as formas de diminuir acentuadamente o risco de morte infantil.

“Assim, o co-leito deve ser evitado se um dos pais faz uso de álcool ou de medicamentos sedativos, se a mãe é fumante, se o bebê é alimentado com fórmula, se a roupa de cama por baixo é suave como uma pele de carneiro ou se a cama tem colchão d'água. Não importa onde o bebê dorme, ele não deve estar em um quarto sozinho e deve dormir com a barriga para cima. Dormir de bruços ou de lado são posições mais arriscadas e não recomendadas para o bebê dormir. Acima de tudo, os pais nunca devem dormir com um bebê em um sofá ou cadeira, lugares muito mais perigosos”, informa Chencinski.

Algumas autoridades médicas reconhecem que existem benefícios em compartilhar a cama com um bebê, tal como a facilidade do aleitamento materno, o aumento do número de mamadas noturnas e um incremento na relação com a mãe. Independentemente disso, autoridades de outros países preconizam que os pais devem ser informados sobre os riscos e benefícios do co-leito para serem capazes de tomar suas próprias decisões informadas.

O quão inseguro é o co-leito, afinal? “Como muitas situações na ciência e na medicina, a resposta não é nem simples, nem clara. Os estudos sobre co-leito, muitas vezes, aglomeram camas e sofás juntos, quando se olha para a mortalidade infantil, tornando-se impossível distinguir o verdadeiro risco. Muitas vezes, os estudos não indicam se as crianças foram amamentadas ou não, ainda que a amamentação reduza o risco de SMSI em cerca de 75%. Um estudo recente que tentou analisar a relação da SMSI com o co-leito, sem outros fatores de risco, encontrou um perigo aumentado no co-leito, mas descobriu-se que a informação sobre um dos maiores fatores responsáveis pela SMSI – o consumo de drogas e álcool –  não foi levada em conta, e o risco de fumar não foi totalmente ajustado por um comunicado da UNICEF no Reino Unido”, afirma o pediatra, que também é membro do Departamento de Aleitamento Materno da Sociedade de Pediatria de São Paulo.

Co-leito e amamentação

Além disso, a pesquisa mostra que o co-leito facilita a amamentação e é associado com a maior duração do tempo de amamentação. Mães que amamentam que tentam não adotar o co-leito acabam desistindo da amamentação ou de compartilhar a cama de qualquer maneira. A continuidade da amamentação necessita de alimentação frequente de dia e de noite e de contato próximo frequente, se o bebê assim o solicitar.

O que é muito controverso é que muitos outros fatores representam risco muito maior para a morte infantil do que compartilhar a cama em si. Um desses fatores, que é dormir com a barriga para baixo ou de lado, foi o tema de uma campanha de marketing canadense Back to Sleep, orientando os pais a colocarem seus bebês na posição supina (barriga para cima) como a mais indicada.

“Outro fator de risco, a alimentação com fórmula, não é discutida nas campanhas de marketing social para evitar mortes infantis. Em vez disso, temos anúncios assustadores sobre o co-leito. Parece que é mais fácil convencer as mulheres a manterem a amamentação do que convencê-las a não dormir com seus bebês. O melhor seria fazer anúncios educando as mães sobre os perigos dos sofás e poltronas reclináveis ou que as mulheres recebessem a mensagem de que a cama é um lugar seguro para amamentar o bebê”, defende Moises Chencinski.

“A duração do aleitamento materno tem impactos diretos sobre a obesidade e sobre uma série de doenças na infância. O aleitamento materno impacta positivamente também na saúde das mães. Um tempo menor de  aleitamento materno resulta em um aumento de cerca de 5.000 casos de câncer de mama, 14.000 ataques cardíacos e mais de 50.000 casos de pressão alta, por ano. Assim, todas as recomendações que podem afetar negativamente o aleitamento materno devem levar em conta as implicações para a saúde da mãe e do bebê que o aleitamento materno proporciona, e não apenas uma única doença”, diz o pediatra.

“Dizer às mães, simplesmente, para nunca dividir a cama com seus bebês é uma mensagem fadada ao fracasso, e provavelmente contribuiu para pelo menos algumas mortes infantis em sofás. Em vez de mostrar os anúncios assustadores de crianças em camas com lápides e cutelos, devemos nos concentrar nos esforços educacionais, visando prevenir que mães durmam com seus filhos em sofás e poltronas reclináveis​​, fumem, usem álcool e/ou drogas e façam uso da alimentação com fórmula. E, claro, acima de tudo, devemos apoiar as mães a amamentar”, defende o médico.

 

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